Copa do Mundo e etnocentrismo padrão FIFA


Mesmo promovendo o principal evento do futebol mundial no Catar, um país com leis que legitimam a homofobia, FIFA estende bandeira LGBTQ+ em sua sede. Foto: Divulgação/Twitter oficial da FIFA

Mesmo promovendo o principal evento do futebol mundial no Catar, um país com leis que legitimam a homofobia, FIFA estende bandeira LGBTQ+ em sua sede. Foto: Divulgação/Twitter oficial da FIFA

A Copa do Mundo do Catar trouxe para o futebol mundial muitas discussões importantes sobre o tema desportivo do jogo. Claramente natural a movimentação do assunto, um grande evento, como sempre, movimentou a paixão de torcedores de diversas nações pelo mundo. E a Copa do Catar tem um grande peso de peculiaridade, podemos dar o destaque tanto para o aumento do número de convocados por cada seleção, passando para 26 jogadores, como para a realização da Copa no fim de ano, por conta das altas temperaturas que assolam o país do Oriente Médio no meio do ano (época tradicional para a realização do evento).

Contudo, há questões que vão muito além das 4 linhas, mas que são expressas de forma inconfundível por uma Copa do Mundo. Esporte é política. E, sobretudo, esporte é movimento social. O futebol, nesse caso, é expoente para unir as sociedades, mesmo em meio as diferenças. De modo que, o futebol dentre uma Copa do Mundo possa aproximar nações que não se encontram sequer na ONU – a Fifa tem mais países-membros que a própria Organização das Nações Unidas -, para poder disputar um torneio esportivo movido a paixão.

Entretanto, em 2022, com a Copa sendo realizada no Catar, a FIFA assume a responsabilidade de promover o grande evento desportivo do mundo sem a garantia de seguridade aos cidadãos do mundo. Isto, porque, o Catar é um país onde as diferenças sociais podem ser reprimidas de forma legítima, conforme a legislação disposta no país. Trata-se, portanto, de um exemplo de etnocentrismo imposto ao mundo. Visto que, a FIFA escolhe o país para receber o “mundo”, mesmo que este país não queira receber o mundo em sua forma por acreditar que a diferenciação dentre a cultura imposta pelo governo do Catar seja maligna.

O etnocentrismo é expresso dessa forma. Acreditar que a cultura e os princípios da sociedade pertencente é a ideal ou superior à oposta. 

“Se oferecêssemos aos homens a escolha de todos os costumes do mundo, aqueles que lhes parecessem melhor, eles examinariam a totalidade e acabariam preferindo os seus próprios costumes, tão convencidos estão de que estes são melhores do que todos os outros”, a citação de Heródoto, historiador grego, é mencionada por Roque Laraia em seu livro Cultura: Um Conceito Antropológico e evidencia como a funcionalidade do etnocentrismo pode se tornar ferramenta de preconceito.

Nasser Al Khater, presidente do comitê organizador da Copa do Mundo de 2022, já deu declarações sobre o caso do Catar receber pessoas de todas as partes do mundo: “Somos abertos e acolhedores – hospitaleiros. Compreendemos a diferença nas culturas das pessoas. Entendemos a diferença nas crenças das pessoas e, então, acho que, novamente, todos serão bem-vindos e todos serão tratados com respeito.”.

Porém, a insegurança para as minorias que estarão presente no Catar é inconfundível com a postura que o país adota e prega moralmente. Segundo relatório divulgado pela organização Human Rights Watch (HRW) no final de outubro, uma série de ilegalidades cometidas pelo governo do Qatar contra as pessoas LGBT foram registradas. O governo do Qatar negou as informações do relatório e disse que elas são falsas. Ainda que, no Qatar as relações entre pessoas do mesmo sexo e o casamento igualitário sejam proibidas, além de que judicialmente, as pessoas LGBTQ+ podem ser punidas até 7 anos de prisão.

Ainda tratando das incoerências da FIFA, o presidente do comitê da Copa, Nasser Al Khater, tentando contornar o assunto declarou que o Catar será hospitaleiro e receberá bem quaisquer pessoas, incluindo pessoas com relação homoafetiva, porém, destacou como relações afetuosas devem ser vedadas no país:

“O Catar e a sua região são mais conservadores, então as demonstrações públicas de afeto, que são desaprovadas, devem ser evitadas. É a única indicação a ser respeitada, tirando isso, cada um pode viver sua própria vida. Só pedimos aos torcedores que respeitem”.

É com essas demonstrações de intolerância e homofobia que nos situaremos na copa do mundo de 2022. O futebol, assim como qualquer meio social, sempre foi conhecido por ser um âmbito de “habitação” ao machismo e a homofobia, mudar esse quadro é necessário e a luta para o respeito das diversidades e diferenças é essencial. 

Contudo, a escolha da FIFA pelo Catar como sede da Copa do Mundo passa a sua mensagem: será bem-vindo ao evento quem não for diferente ao que a cultura do país considere aceitável. É em meio a esse abraço ao preconceito, que a FIFA, em junho de 2021, se declarou contra a discriminação, através de sua secretária geral Fatma Samoura: 

“Fifa está orgulhosa em apoiar o Mês do Orgulho e celebrar jogadores, técnicos, dirigentes, funcionários, voluntários, líderes e fãs LGBTQIA+ ao redor do mundo. Futebol é um jogo de equipe. Pertence a cada um de nós. A Fifa tem tolerância zero com qualquer forma de discriminação”.

Referências 

UOL. Fifa estende bandeira LGBT em sua sede: ‘Tolerância zero com discriminação’. 25 jul. 2021. Disponível em < https://www.uol.com.br/esporte/ultimas-noticias/2021/06/25/fifa-bandeira-lgbt-sede.html. Acesso em 07 out. 2022.

TERRA. Catar diz que vai ‘acolher’ gays na Copa, mas proíbe beijos. 01 dez. 2021. Disponível em < https://www.terra.com.br/esportes/futebol/copa-2022/catar-diz-que-vai-acolher-gays-na-copa-mas-proibe-beijos,d2b42b89aab201785285cb10ef5bdc35u9ox2a4h.html.  Acesso em 07 out. 2022.

LARAIA, Roque de barros. Cultura: um conceito antropológico. Rio de Janeiro: Zahar, 2007.

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