
Os maiores jogadores do mundo, franquias reconhecidas, basquete de alto nível, sucesso profissional e talvez o sonho de todo jogador de basquete. Tudo isso pode não importar quando o assunto é saúde mental, que ultimamente esteve em voga na NBA. A ‘doença do século XXI’, assim como é chamada a depressão, ganhou espaço nos últimos anos na Liga que, após relatos de alguns jogadores, passou a ser discutida, embora ainda seja considerada um tabu.
Mesmo com todo o glamour de estar na NBA, são muitos os fatores que levam um jogador a apresentar sinais depressivos. A longa jornada de treinos e jogos consecutivos afeta na convivência com a família, visto que a temporada da NBA possui ao todo?—?fora os playoffs?—?82 jogos. Além de alguns dos jogos serem em intervalos de apenas um dia?—?conhecidos como back-to-back?—? partidas em feriados específicos como o dia de ação de graças, tradicional nos Estados Unidos, e a rodada de Natal. Fora os sacrifícios diários de uma carreira profissional, o risco de uma lesão, a necessidade de se provar a cada dia que é bom o bastante para estar entre os melhores, o que torna a vida de um atleta profissional desgastante mentalmente.
Além disso, a cobrança por resultados, principalmente no mundo virtual onde o anônimo tem voz, afeta diretamente na vida do atleta e em seus efeitos dentro e fora de quadra. No basquete, que é considerado um esporte muito mental, as reações dos torcedores, a provocação do adversário, as indagações feitas pela imprensa, todos esses fatores interferem diretamente na performance do atleta em quadra. Em muitos casos, a imagem de um jogador pode parecer saudável por meio de seu jogo, do seu talento jogando basquete, mas, no lado humano, sem estar vestindo uma jersey, pode estar uma pessoa que sofre todos os dias.
O primeiro que veio a público falar sobre essa questão foi o ala-armador DeMar Derozan, atualmente no San Antonio Spurs. Na época, ainda como jogador do Toronto Raptors, Derozan usou das redes sociais para expor a sua luta diária contra a depressão. A publicação pegou todos de surpresa, visto que o jogador manteve o seu jogo em alto nível. Em entrevista ao The Toronto Star, o all-star falou melhor sobre o momento que passava: “Não é nada de que me envergonhe. Agora, na minha idade, tenho ciência de quantas pessoas passam por isso. Mesmo que algumas possam olhar e dizer coisas como ‘ele passa por isso e ainda está aí tendo sucesso e fazendo as coisas’, estou bem com isso”, disse Derozan. O jogador, quatro vezes all-star, abriu uma importante porta para que outros atletas pudessem se encorajar e tornar público o problema com a depressão, além de desconstruir um pensamento retrógrado em relação à doença.

Logo em seguida, o também all-star Kevin Love falou, através de um texto publicado no site The Player’s tribune, sobre um ataque de pânico sofrido durante um jogo da temporada regular. O ataque aconteceu no intervalo da partida contra o Atlanta Hawks, no dia 5 de novembro do ano passado. Segundo Love, o ocorrido mudou sua opinião sobre saúde mental: “Por 29 anos, sempre pensei que saúde mental fosse um problema dos outros. Para mim, era uma espécie de fraqueza que poderia tolher o meu sucesso no esporte ou me fazer parecer estranho ou diferente”. Vale ressaltar a comum associação de saúde mental com fraqueza ou insucesso profissional, o que fomenta uma banalização no ambiente esportivo por doenças desse tipo. O cuidado com a parte mental dos jogadores, desde os primeiros jogos no basquete universitário, é muitas vezes deixado de lado pela comissão técnica, que visa o desempenho físico como o objetivo principal.
Contudo, não só jogadores no auge de suas carreiras passam por problemas de saúde mental na NBA. Em meados do ano passado, o veterano Nate Robinson, que já jogou pelo New York Knicks e pelo Boston Celtics, deu entrevista ao site Bleacher Report externando sua luta contra a depressão. Segundo ele, a NBA causou a doença. Robinson é conhecido pelo seu jeito carismático e, de certa maneira, pouco profissional de jogar basquete. O armador de 1,75m nunca escondeu sua forma brincalhona de lidar com a profissão, mesmo que lhe causasse problemas: “Eu era uma criança dentro de uma loja de doces olhando para os melhores doces já feitos. […] Eu não ligava pra nada. Eu queria apenas aparecer no SportsCenter e contar aos meus amigos que agora eu estava lá”. Após a temporada 15–16, quando defendeu as cores do New Orleans Pelicans, Robinson jogou pelo Hapoel Tel Aviv, de Israel, e no Guaros de Lara, da Venezuela. Mas continuou questionado sobre sua forma de lidar com a profissão, o que fez com que agravasse seu quadro depressivo. Hoje, diz encarar de outra forma toda essa cobrança de uma liga profissional, embora não abra mão do seu jeito de ser: “Não há ninguém mais você do que você mesmo. É assim que eu vivo, é assim que eu jogo. Eu não sei jogar ou ser alguém que não seja Nate Robinson”, concluiu.
Recentemente foi a vez de Michael Beasley também usar das redes sociais para mostrar seus problemas com a depressão. O ex-jogador dos Los Angeles Lakers perdeu todo o início da temporada por conta da morte de sua mãe, vítima de câncer. “Com sinceridade, desde que partiste tenho passado a odiar tudo e tanta gente. Não consigo afastar a sensação de estar sozinho. Não sabes o quanto fiquei magoado. Sei que é egoísta, mas já não gosto de estar cá… Vejo-te em breve, prometo”, escreveu Beasley em sua conta no Instagram.

Por fim, saúde mental no meio esportivo é importante. Todos esses casos são somente alguns que se sentiram confortáveis de externar toda a situação, mas outros, provavelmente, podem ainda estar escondidos. São vários os casos de ex-jogadores que tiveram passagem pela Liga e, agora aposentados, comentam sobre problemas mentais durante a carreira, como é o caso de Delonte West, Metta World Peace, Jerry West e Larry Sanders. A aptidão física dos jogadores é levada em conta na hora de serem selecionados durante o draft, mas pouco é considerado sobre sua qualidade mental. No ano passado, após uma pressão feita pela NBA Player Association?—?sindicato dos jogadores da Liga?—?a NBA formou um conselho com acompanhamento de psicólogos para prestar auxílio aos jogadores e ter um acompanhamento mais próximo sobre a saúde mental deles. Mesmo que seja uma atitude pioneira no esporte, o bem-estar do atleta ainda é pouco preservado, em detrimento do espetáculo e de todo glamour que cerca a maior Liga de basquete do mundo. Embora a Liga já tenha percebido que a saúde mental é uma pauta que está em questão atualmente, os moldes da temporada não vão ao encontro do bem-estar dos jogadores que produzem o espetáculo. A quantidade absurda de jogos, a cobrança por resultados e a atuação massiva da imprensa na vida particular ainda são fatores que fazem parte da rotina de um jogador da NBA. A atitude é necessária, mas vale pensar em uma nova maneira de organizar a Liga, sendo saudável também para os melhores jogadores de basquete do mundo.