Observatório Social do Futebol lança “Mapa das Amizades Sul-Americanas”

O Observatório Social do Futebol lança o Mapa das Amizades Sul-Americanas, um produto interativo que mapeia relações de solidariedade e fraternidade entre torcidas e clubes de diferentes países da Confederação Sul-Americana de Futebol (CONMEBOL).

Desenvolvido em parceria com o pesquisador e historiador Matias Pinto, a partir da exposição Cancha Brava: Futebol Sudamericano en Disputa, inaugurada em 16 de outubro deste ano, no Museu do Futebol, o projeto apresenta, de forma interativa, 37 vínculos de amizade entre barras/torcidas de clubes de diferentes países do continente, classificados em seis categorias: aproximação cromática; amizades em viagens; amizades a partir de jogos; nomes/apelidos em comum; solidariedade; e ídolos em comum.

Essas relações podem assumir diferentes formas: algumas se configuram como amizades institucionais entre clubes; outras, como alianças entre barras e torcidas organizadas; e há ainda casos em que a conexão se estende a ambos os níveis — institucional e torcedor —, caracterizando vínculos firmes e duradouros.

A lista apresentada não pretende esgotar todas as amizades existentes na região. Foram incluídos apenas os casos que atendem aos seguintes critérios: I) vigência atual da relação; II) reconhecimento recíproco (ou seja, aceitação por ambas as partes); III) representatividade regional, contemplando clubes de todos os países membros da CONMEBOL.

No total, o mapa registra 37 relações de amizade entre torcidas e clubes sul-americanos, distribuídas em seis categorias, de acordo com a origem ou o motivo do vínculo. As categorias são: aproximação cromática; amizades em viagens; amizades a partir de jogos; nomes/apelidos em comum; solidariedade; e ídolos em comum. É importante destacar que um mesmo clube pode figurar em mais de uma amizade, assim como uma mesma relação pode se enquadrar em várias categorias.

A categoria “aproximação cromática” é a mais recorrente, com doze (12) casos identificados. Ela se refere às afinidades cromáticas entre uniformes ou distintivos dos clubes. Alguns exemplos são: Almagro (ARG) e Grêmio (BRA); The Strongest (BOL) e Deportivo Táchira (VEN); e Banfield (ARG) e Atlético Nacional de Medellín (COL). As cores, frequentemente consideradas o “DNA” das torcidas, funcionam como um marcador identitário fundamental e, por isso, são um motivo lógico de aproximação entre clubes.

A segunda categoria “amizades em viagens” reúne nove (9) amizades originadas a partir de gestos de hospitalidade, apoio logístico ou solidariedade durante deslocamentos internacionais de torcedores. Em um contexto de aumento dos jogos entre times no continente, essas experiências têm se tornado cada vez mais frequentes, reforçando laços de cooperação e reciprocidade entre grupos de torcedores. Exemplos incluem as relações entre Chacarita Juniors (ARG) e São Paulo (BRA); Deportivo Pereira (COL) e Unión Española (CHI); Flamengo (BRA) e Lanús (ARG). Aqui falamos de uma solidariedade regida pela reciprocidade, já que, segundo os códigos de arquibancada, quem foi acolhido deve, em algum momento, acolher.

A terceira categoria agrupa sete (7) vínculos nascidos de “amizades a partir de jogos” esportivos, sejam amistosos ou competições oficiais, que marcaram o início de vínculos duradouros. Um exemplo notável é a amizade entre Estudiantes de Caseros (ARG) e Wanderers (URU), estabelecida após um amistoso em 1903, considerada a mais antiga da região. Situação semelhante ocorreu entre Estudiantes de La Plata (ARG) e Peñarol (URU), a partir de uma série de amistosos disputados entre as décadas de 1920 e 1930.

A quarta categoria envolve cinco (5) casos de amizades motivadas por “nomes/apelidos em comum”, como as relações entre Independiente (ARG) e América de Cali (COL) — ambos identificados como “Diablos”; entre os Wanderers do Uruguai e do Chile; e o curioso caso entre Fortaleza (BRA) e Atlético Bucaramanga (COL), vinculados pela palavra “Fortaleza”, presente tanto no nome do clube brasileiro quanto no da barra colombiana.

Já a categoria “solidariedade” inclui dois (2) casos emblemáticos de fraternidade motivada por tragédias aéreas. O primeiro é o de Alianza Lima (PER) e Colo-Colo (CHI), cuja relação se consolidou após o acidente aéreo do Fokker F27, em 1987, que vitimou 16 jogadores do clube peruano. O Colo-Colo, em um gesto solidário, cedeu quatro atletas de seu elenco ao Alianza Lima sem custo nenhum. E o segundo, mais recente, é entre Chapecoense (BRA) e Atlético Nacional (COL), quando a delegação brasileira se dirigia a Medellín para a disputa da final da Copa Sul-Americana, em 2016, e o voo LaMia 2933 caiu no Cerro Gordo, quando se aproximava do Aeroporto de Rio Negro, vitimando fatalmente 71 pessoas. O Atlético Nacional reagiu pedindo oficialmente à CONMEBOL que outorgasse o título à Chapecoense, em homenagem às vítimas. No dia marcado para a final, 30 de novembro, o clube colombiano convocou sua torcida para comparecer ao Estádio Atanasio Girardot vestida de branco, em um ato coletivo de solidariedade e memória.

Por fim, a categoria “ídolos em comum”, com dois (2) casos, diz respeito a vínculos formados em torno de figuras históricas que atuaram em ambos os clubes. É o caso de River Plate (ARG) e Millonarios (COL), conectados pelos ídolos Amadeo Carrizo e Alfredo Di Stéfano, além do apelido “Los Millonarios”. Outro exemplo é a amizade entre Grêmio (BRA) e Nacional (URU), unida por jogadores como Atilio Ancheta, Hugo de León e, mais recentemente, Luis Suárez.

O levantamento revela como o futebol sul-americano é atravessado por laços de convivência, cooperação e afetividade, contrariando a visão que o associa exclusivamente à violência. O Observatório destaca que essas relações se constroem a partir de práticas cotidianas de hospitalidade, trocas culturais e reconhecimento mútuo entre torcedores e clubes de diferentes países.

O projeto integra a Linha 1 – Violências e Convivências no Futebol do Observatório e será disponibilizado online, em formato interativo, para consulta pública e uso acadêmico.

Autores: João Vitor Sudário, Nicolás Cabrera, Matias Pinto, Raquel Sousa, Paula Barreiro e Vitória Farias

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