A vitória do filme “Spotlight” no último Oscar joga luz sobre a função social do jornalista. Jornalismo que desvela segredos que de alguma forma afetam a vida de uma determinada comunidade. Na história roteirizada, um grupo de repórteres do The Boston Globe investiga os abusos de padres católicos com crianças. Há alguns anos, tenho o desafio de ensinar Jornalismo Esportivo para jornalistas em formação. Digo desafio porque – assim como as mais variadas especializações da área – você é colocado diante de dilemas de “como fazer” e “o que se tem feito”.
Aprendi em salas de aula e redações que repórter é aquele que relata um fato, está presente e serve de ponte entre o leitor/telespectador/ouvinte e o acontecimento. Ele não é o acontecimento, salvo em raríssimos casos. Hoje, o que temos é uma cobertura exaustiva em cima dos repórteres – principalmente na TV – onde qualquer detalhe da vida do profissional é pautado, desde uma gravidez até uma postagem na praia. Entendo que esse tipo de matéria busca criar uma proximidade entre eles e os receptores da notícia. Afinal, ao retratar o jornalista no seu cotidiano, contando suas histórias e o tornando personagem – mesmo quando o assunto não diz respeito ao esporte -, a aproximação é fortalecida, temos empatia e possíveis bons números de “audiência”.
Só que este tipo de “Jornalismo” é uma arapuca. Transformamos o papel dos repórteres. Na balança, é comum vermos matérias mais voltadas para o humor do que para a informação. Fechamos os olhos para alguns quesitos básicos da profissão. Outros, fundamentais como questões éticas. Não respeitamos os lados envolvidos, confiamos em releases e posts de Facebook. Quase nunca checamos as informações.
O Jornalismo de Spotlight é o de investigar! Buscar dados, estatísticas, bastidores, regulamentos, regras… O que está sendo feito de errado? Quais modelos dão certo? Máfias da Loteria Esportiva ou do Apito são pautas cada vez mais raras no Jornalismo Esportivo diário.
A mídia tradicional trabalha mais na promoção de eventos do que na crítica. Vemos isso nos Jogos do Rio-2016. Pode ser ignorância minha, mas até hoje não observei no noticiário diário, dossiês sobre Infantino, novo presidente da Fifa. Por que tantos caíram na Federação? Quem está efetivamente a frente da CBF? Na maioria, são abordagens superficiais. Não investigamos. O que não é Jornalismo, já que, por si só, o jornalismo é investigativo. Que tenhamos mais Jamil Chade!
A rotina produtiva atual de uma redação, onde temos a desvalorização do profissional, a crise financeira de algumas instituições, com o enxugamento do quadro e os “passaralhos” pode dificultar a investigação e a produção de uma reportagem mais elaborada, mas não é desculpa para sempre trabalhar de forma rasa.
Apurar: verbo que precisa ser reforçado com uma nova geração que surge à mercê de redes sociais e “páginas não confiáveis”. Todo mundo faz Jornalismo, diziam alguns ministros do Supremo na queda da exigência do diploma para exercer a profissão, em 2009. Não, todo mundo escreve, relata um acontecimento – verdadeiro ou não – e tem acesso a plataformas de divulgação para esse fato. Sem cuidados éticos e teóricos. Fazer isso não o torna jornalista.
Esporte é entretenimento, sim. Mas Jornalismo não é piada.
Bom saber.