‘Já podeis da Pátria filhos
Ver contente a Mãe gentil;
Já raiou a Liberdade
No Horizonte do Brasil’
Retomo aqui um assunto que estamos, nosotros do grupo de pesquisas, investigando há alguns anos. Trata-se da mudança de posicionamento dos torcedores brasileiros em relação ao selecionado nacional, à outrora adorada e venerada seleção canarinho.
Em um artigo escrito conjuntamente, de nome “Pra frente, Brasil”(2008), começamos a esboçar algum entendimento sobre o assunto. Tal artigo está tendo longa vida acadêmica, e creio que é, e o afirmo sem medo de ser leviano, o primeiro a tocar nesse assunto, já ligando tal objeto à copa de 2014.
Bem, neste artigo, disponível aqui no blogui, tentamos jogar alguma luz sobre os fatores componentes da união e a identidade nacional e investigamos os motivos pelos quais a seleção brasileira começou a perder seu poder de atração dentro do país.
Nossos questionamentos teóricos nos apontam que o êxodo de jogadores brasileiros para clubes estrangeiros diminuiu muito a identificação do torcedor com a seleção. Se antes os jogadores que representavam o país, nossa “pátria de chuteiras” eram aqueles mesmos atletas que brilhavam nos tradicionais clubes tupiniquins, agora esses não mais envergam a camisa amarela, sendo a mesma vestida por “estrangeiros” que algumas vezes nem chegaram a ter sucesso em clubes brasileiros.
Não gosto de conjecturas teóricas desprovidas de embasamento empírico, logo, usei a metodologia desenvolvida pelo gaúcho (e colorado, reparem como o regional e a paixão clubística sempre fala mais alto que a mistura nacional) Édison Gastaldo. Ele saiu às ruas para ver como era a recepção midiática aos jogos da seleção brasileira durante os jogos.
Fiz o mesmo teste em duas ocasiões distintas. Claro que reconheço as limitações de uma observação direta de forma não criteriosa, porém tudo indica que estes indícios são corretos. Vou citar apenas o caso mais emblemático e recente: O último jogo “pra valer” da seleção brasileira: Brasil 2 x 2 Paraguai, dia 09/07/2011, no Estádio Mário Kempes, em Córdoba, Argentina. Era a semifinal da Copa América de Futebol, um jogo de vida ou muerte para o Brasil e todos os brasileiros estavam colados na televisão, sem piscar, torcendo pelo sucesso brasileiro na terra de nossos “maiores inimigos” (sic), a Argentina, certo?
ERRADO! O dia em questão era um sábado, e a partida foi realizada à tarde. Pasmem, alguém (e não foram poucas pessoas) teve a audácia de marcar uma festa infantil no mesmo horário!
Então, lá fui eu até a tal festa. No caminho passei por outras festas… todas lotadas! Lembrem, a bola estava rolando! E essas pessoas, centenas, milhares de ‘brasileiros’, não estavam nem ligando pro que acontecia no rincão argentino! Nosso destino sendo decidido e eles conversando sobre os rumos da cartilogência e a influência da taioba na culinária paraense… batendo palmas e filmando suas crias, enquanto nossos heróis nacionais suavam sangue em terras inimigas!
Pois bem, fiquei na rua e contei, em alguns minutos, mais de 200 carros transitando, ônibus e táxi circulando normalmente. Nos salões de festas e num clube próximo, havia televisões exibindo o jogo, mas poucos eram os “verdadeiros” nacionalistas que prestavam atenção à disputa. A batalha, mesmo aqui, em solo nacional, estava perdida para os cantores sertanejos cujos discos tocavam na festa e alguns fanqueiros em bares próximos. Triste fim da outrora pátria de chuteiras!
Nossos combatentes, talvez de longe sentindo a falta de apoio de seus correligionários, acabaram sucumbindo no ardor da disputa. Tombaram, aniquilados pelo poderio questionável dos descendentes de Solano López.
Ao invés de lágrimas, o silêncio. Nenhuma trombeta soou. Ao contrário, alguns brasileiros assim reagiram à fatídica derrota [1]:
– EU COLOQUEI 2 X 1 PRO PARAGUAI IMBECIL ! MAS A MERDA DO BRASIL TINHA QUE EMPATAR NO FINALZINHO
– VAAAAASSCO (yn)
– KKKKK SE F* OTARIO 2X2 , NEM COLOCOU 2X1
– torcedor do são paulo, disse:
Mas se continuar com esse futebolzinho fraco, num chega a lugar nenhum.
Coloquei: Brasil 1 x 2 Paraguai!
– eu até q gostava do paraguai, mas to ficando com raiva já, esses narco-traficantes safados, comerciantes de crack e maconha, idiotas/ BRASIL TE AMOOOO
Na mídia especializada também não se reagiu muito diferente [2]:
Eles eram considerados os principais jogadores da Seleção Brasileira na disputa da Copa América. Chegaram à Argentina como esperanças de um belo futebol da renovada equipe de Mano Menezes. Mas em campo, o meia Paulo Henrique Ganso e o atacante Neymar, ambos do Santos, não tiveram desempenhos condizentes com as expectativas dos torcedores, da imprensa e da própria comissão técnica do time canarinho. (globoesporte.com)
Ressalte-se aqui que os dois jogadores cobrados pela imprensa são os dois (ainda) brasileiros, Neymar e Paulo H. “Ganso”, que ainda não foram seduzidos pelos europeus.
Enfim, tudo aponta no sentido de que os brasileiros, atualmente, sentem-se mais representados por seus clubes que pela seleção brasileira. Lembro inclusive de uma partida do Brasil contra a Argentina, em 1998, no finado Maracanã, em que o zagueiro flamenguista Júnior Baiano, após falha bisonha que originou o gol de Cláudio ‘el piojo’ Lopez, fora vaiado por torcedores ‘rivais’, e defendeu-se na entrevista: “Eles têm que entender que isso aqui é a seleção brasileira! Não é flamengo, nem Vasco ou Fluminense, não é nada!”
Sábias palavras, Baiano… Não é nada. Só um ruído ao fundo. Infelizmente.
Outrora, ‘Do Universo, entre as nações, resplandecia a do Brasil’ e ‘Zombou deles o Brasil’…
Hoje, Zombam do Brasil os brasileiros.