O que escolher?

Não é nenhuma novidade que a quantidade de informações a que estamos expostos atualmente não encontra precedentes na história humana. A tendência, aliás, é que isso se intensifique nos próximos anos. No mundo dos esportes, isso talvez seja mais facilmente perceptível do que em outras esferas sociais. São variados os sites de notícia, apps, programas de TV, jogos ao vivo, fantasy games, podcasts, canais no Youtube, perfis no Insta dedicados ao tema. Enfim, trata-se de uma infinidade de conteúdos à disposição de quem possui tempo para acessá-los e os dispositivos e assinaturas necessários para poder consumir todos ou alguns desses produtos. Sim, porque nada é totalmente de graça no século XXI. Boa parte dos conteúdos ao vivo de esporte está pulverizada por cerca de meia dúzia de empresas de comunicação. Um bom exercício de imaginação é supor o que Umberto Eco teria a nos dizer sobre isso – se, na década de 1980, ele já se queixava da “falação esportiva”, qual termo cunharia hoje para descrever o que vivemos?

Nos anos 1980, crescia a quantidade de programas de debate esportivo na televisão, comentando os jogos recém-encerrados, a rodada de um campeonato ou o mercado da bola. Atualmente, esse tipo de programa não está mais apenas nos canais televisivos; a concorrência agora é muito mais ampla. Aliás, o esporte concorre com inúmeras outras possibilidades de entretenimento audiovisual. Isso talvez explique por que o jornalismo esportivo pende cada vez mais para o humor, em detrimento da informação, para conseguir prender a atenção do espectador (não que humor e informação não possam caminhar juntos eventualmente…). Outro nicho em ascensão são os “influenciadores dos clubes”. Torcedores comuns, com ou sem diploma de jornalistas, que emitem suas opiniões sobre seus times do coração. Muitas vezes nesses vídeos, o influenciador “comenta” os comentários das mesas-redondas televisivas (boa parte das vezes discordando de um ou outro jornalista, que estaria supostamente contra o seu clube e favor dos rivais). Qual seria o próximo passo? Todo torcedor, em seus perfis pessoais na rede social em alta no momento, tecendo comentários sobre a opinião dos influenciadores, os quais por sua vez analisam os jornalistas dos grandes canais de TV? Se pensarmos bem, essa situação já ocorre nas caixas de comentários do Youtube, Instagram, Twitter…

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Como processar tantos dados? Dada a complexidade crescente da indústria do esporte, é demandado do torcedor conhecer o jogo para muito além das quatro linhas. Debates econômicos, antes restritos aos bastidores, vêm cada vez mais para a frente do palco. Clube-empresa, patrocínios, naming rights… são assuntos que hoje ocupam espaço nas conversas entre aficionados por esporte. “Meu clube fatura mais com patrocínios que o seu”, “Meu clube tem mais sócios”, “O estádio do meu clube lucra mais com naming rights” – não consigo imaginar esse tipo de afirmação sendo feita, por exemplo, na década de 1950. Se atualmente esses tópicos estão na ordem dos temas circulantes, isso se justifica, em parte, pelo que falei no início deste texto – quantidade cada vez maior de informação, sobre qualquer assunto e também sobre futebol. Outro exemplo são os fantasy games de esporte (como o Cartola FC), que, sob o incentivo de transformar qualquer torcedor em técnico, busca instigar que os usuários procurem informações não apenas sobre seu clube favorito, mas sobre todos os outros que disputam o campeonato. Pelo lado do torcedor/usuário, essa informação lhe permitirá escalar melhor seu time na plataforma, ao custo de mais tempo gasto no consumo de informação esportiva. Pelo lado da empresa, isso proporciona maior retenção de usuários em suas plataformas (logo, mais engajamento, alcance e todas aquelas métricas de marketing conhecidas) e, finalmente, a capacidade de barganhar com anunciantes por cotas maiores de publicidade.

Para que esse texto não fique excessivamente extenso e perca o seu curso, acho que podemos encerrar nos perguntando: como selecionar o conteúdo que, de fato, queremos assistir e não o conteúdo que nos é forçado goela abaixo pelos algoritmos das redes sociais ou pela programação televisiva? Acredito que, cada vez mais, tenhamos de agir tal qual gatekeepers da nossa própria grade de programação, não apenas fracionando o tempo dos nossos descansos entre os vários divertimentos que cultivamos, mas também hierarquizando o que julgamos relevante daquilo que não nos acrescenta muita coisa (seja em termos de informação ou mesmo de diversão). E, se você considera divertido mesas-redondas com mais humor do que informação, vá em frente e coloque esse programa no topo da sua hierarquia. Por outro lado, se você só assiste esses programas meio que por inércia, repense suas escolhas. Existem podcasts esportivos com informação de muito mais qualidade, sem abrir mão de uma linguagem acessível (vide o nosso Passes e Impasses, por exemplo). Para além da questão da qualidade do conteúdo, existe o tempo a ser gasto. Se você tem tempo de sobra e consumir esporte te dá mais prazer do que arrependimentos, acredito que não há problema em ser utilitarista aqui. No entanto, se a sua semana é corrida, e tempo é item escasso na sua vida, pense em dosar o consumo diário de esportes (temos aplicativos de controle de rotina e de gerenciamento de atividades que podem te ajudar com isso).

Em resumo, em nossa sociedade hiperinformacional, a gestão do tempo talvez seja o maior desafio, tanto para as empresas em geral, que querem mais e mais nacos da sua atenção diária, quanto para você, que deve direcionar o seu foco para aquilo que realmente é do seu interesse e não para o que lhe é imposto.

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