Manifestações nos estados de São Paulo e do Rio de Janeiro vêm acontecendo nas últimas semanas, organizadas como forma de cobranças por direitos populacionais mais justos e coerentes, tendo o aumento nas tarifas dos transportes públicos como a “última gota” que fez o copo transbordar de vez. Ganhou notabilidade internacional e vem sendo chamada, vulgarmente, de “Revolta da Salada” – alusão à proibição do uso de vinagre nos protestos, que amenizariam as reações causadas pelo gás lacrimogênio, usado pela polícia como forma de manter a ordem.
Em outros tempos, o futebol era o motivo principal para iniciativas que deixavam as ruas cheias, seja para comemorações, seja para protestos. Convenhamos, é mais comum, aqui no Brasil, uma ação como essa com fins relacionados ao futebol – até os “gringos” sabem. O curioso ao se pensar essas últimas movimentações são as suas projeções e relações no próprio âmbito futebolístico.
Na última semana, foram criados, nas redes sociais, vídeos e imagens, buscando apoio aos movimentos de protesto. Até aí, nada de novo. Porém, o fator marcante nesta ocasião é a forma como tal chamada foi feita: imagens dos quatro grandes clubes (tanto de São Paulo quanto do Rio de Janeiro) foram associadas às mensagens de luta e pedidos de suporte na defesa do interesse público.
Resumindo: os organizadores dos movimentos mencionados utilizam o interesse do torcedor de futebol como forma de atraí-lo para as manifestações. Talvez, busque-se a mesma intensidade de participação que ocorre nos movimentos clubistas, e a paixão pelo esporte vira chamariz.
Esse evento traz consigo a imagem da força do fenômeno futebolístico, podendo servir como propaganda para tudo; isso já foi compreendido há tempos pelos ‘marketeiros’ e propagandistas. Gaúcho, Fenômeno e Neymar que o digam.
É claro que, diferentemente dos meios comerciais, agora há um interesse geral em jogo, mas a apropriação, talvez, seja a mesma, e até de uma forma otimizada: passionalmente, um torcedor do Palmeiras pode não comprar um produto que tem um jogador corinthiano como garoto-propaganda; no entanto, o brado de convocação do vídeo é para que os torcedores venham, assim como vão torcer para os seus clubes, mas que venham “descamisados” – a representação que se busca não é fragmentada, é em prol de “um só Brasil”. A mensagem lembra até o discurso feito pelo técnico da Seleção brasileira, Felipão, após a convocação para a Copa das Confederações, buscando o apoio de todos os torcedores.
Torcedor clubista, principalmente de torcida organizada, gosta de movimentações como essas. Deve, inclusive, estar sentindo falta, já que o “brasileirão” se encontra paralisado e continuará durante mais algum tempo, devido à Copa das Confederações. É o casamento perfeito.
A participação desse torcedor, “fisgado” por esse meio muito inteligente, talvez, não se dê de maneira totalmente consciente (característica de muitas ações em massa), mas satisfaz (em parte) à necessidade da manifestação. Simploriamente falando, o torcedor anda de ônibus e pode não estar satisfeito com a situação, mas será que, não havendo o apelo ao “clubismo”, ele estaria presente, protestando?
De qualquer forma, essa foi uma manobra muito interessante. Fico na torcida para que esses torcedores-manifestantes, convocados a defenderem a pátria, se não tão lúcidos quanto ao evento e seus propósitos, consigam tomar ciência dos fatos importantes relacionados aos protestos e possam defender o interesse público com a mesma avidez que torcem por seus clubes. E que tomem gosto!
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