A era das arenas esportivas no Brasil e o Maracanã-mercadoria

De acordo com Mascarenhas (2013) há um novo estádio que surge e que disputa o sentido do espaço urbano. Repaginado com terminologias como “modernização”, “adequação”, “higienização”, “renovação”, dentre outras, fato é que os novos estádios aplicam uma profunda mudança na economia não apenas do futebol, mas da sociedade brasileira. Acomodando, sobretudo, um processo de espetacularização dentro dos espaços de sociabilidade, trocando o valor de uso pelo valor de troca. Neste sentido, o autor destaca que nas últimas décadas foram construídos estádios caros, muitas das vezes superdimensionados cuja justificativa não se coaduna com as características locais. Em suma, os novos estádios são bem diferentes do passado, remodelam aspectos e dinâmicas sociais, orientam novos significados, públicos e racionalidades. Para exemplificar tal questão, Mascarenhas (2013) cita a Liga Portuguesa, em Portugal, quando, em 2004, foram construídos estádios em “cidades que não dispõem de mercado local para sustentar tais equipamentos” (MASCARENHAS, 2013, p.144). Esta leitura poderia ser feita facilmente em alguns estádios construídos no Brasil para a Copa do Mundo de 2014, como o Mané Garrincha, em Brasília; estádio das Dunas, em Natal; Arena Amazônia, em Manaus; Arena Pantanal, em Cuiabá. Neste sentido, cabe incluir o argumento do autor, utilizado para se referir à em Portugal.

Encontra-se abrigado no novo formato extravagante e monumental dos megaeventos esportivos, mas também diálogo integrado com novas estratégias de gestão das cidades no sentido da valorização e da projeção competitiva de sua imagem global – o citymarketing -, bem como parece estar associado à hipotética “ máquina urbana”. do crescimento” de que nos falam Logan e Molotch (1990). (MASCARENHAS, 2013, p.144).

Com isto, os estádios construídos ou reformados para a Copa do Mundo de 2014 deram um novo sentido às cidades. Diante desta perspectiva, é possível pensar que há necessidades e interesses para além da economia do futebol-espetáculo (MASCARENHAS, 2013). É possível se referir, portanto, há um movimento mais amplo, no qual se reorganiza uma nova lógica de cidade, conforme apontamos acima. Mascarenhas (2013) ainda destaca que, apesar dos estádios antigos também serem movidos por um sentido mercadológico, na medida em que é preciso comprar ingresso para acessá-los internamente, as novas arenas ampliam esta dinâmica e dão um novo contorno nas relações de sociabilidade. A experiência transacional do torcedor nas arenas perpassa a compra do ingresso, muitas vezes a partir do cartão de sócio-torcedor, parece mercadológico ancorado na ideia de maximização das receitas dos clubes. 

No que tange ao Maracanã, o estádio também passou por reformulações de branding e design. Duas somente após 2013. Esta é mais uma camada para tornar o Maracanã uma plataforma comunicacional atrativa para consumidores e, principalmente, marcas. Dito de outra forma, o processo de transformar um bem público em produto visa maximizar as receitas do estádio atraindo linhas de receita business to business (B2B) bem como business to consumer (B2C). Como aponta a Saravah Comunicação e Design em projeto apresentado na 12ª Bienal Brasileira de Design Gráfico, sobre a primeira construção da identidade visual do Maracanã após a reforma de 2013, um dos principais desafios foi atrelar o apego à experiência do passado com a percepção de que o estádio havia se tornado elitista.      

Ainda em seu texto, a empresa ressalta como positivos os resultados que o novo branding do Maracanã trouxe. Para citar alguns pontos, o aumento da mídia pública que nos demais estádios, o segundo ponto turístico da cidade do Rio, o registro na coleta de patrocinadores em 2015, além de vários eventos corporativos realizados. Estes resultados elencados vão ao encontro do que entendemos ser um movimento, iniciado em 2013, e que se mostra bem-sucedido: de posicionar o Maracanã como uma plataforma de entretenimento. Nas figuras abaixo, é possível ver a primeira identidade visual do estádio após a reforma de 2013 e os produtos licenciados oriundos dela.

Figura 1: A nova logo do Maracanã após 2013
Figura 2: os produtos licenciados para serem comercializados no novo Maracanã
Figura 3: A ambientação da identidade visual dentro do estádio
Figura 4: A ambientação da identidade visual dentro e fora do estádio

É possível exemplificar a partir dessas figuras todo processo direcionado para transformar o Maracanã em um produto da iniciativa privada.

A partir dessas imagens, é possível compreendermos as mudanças estruturais com que o Maracanã passa a partir de dois processos nomeados por Jeudy (2005) como patrimonialização e estetização urbana cujas consequências se dão na espetacularização das cidades. Dinâmicas sob as quais, como vimos a partir dos exemplos do Maracanã, são indissociáveis ??das estratégias de marketing. Jeudy (2015) aponta para um modelo de gestão patrimonial que padroniza bens culturais a luz dos turistas internacionais e referências estrangeiras. Fato que é possível identificar nos estádios brasileiros. Fenômeno que pode resultar em um estádio opaco, um produto que pode ser facilmente replicável para outros lugares. A diferença, portanto, que pode ser utilizada como uma vantagem competitiva é justamente os torcedores que transformam o lugar, reorientam, tornam o estádio vivo e pulsante sendo ativos do espetáculo.

Referências bibliográficas:

MASCARENHAS, Gilmar. Um jogo decisivo, mas que não termina: a disputa pelo sentido da cidade nos estádios de futebol.  Revista Cidades , v. 10, ed. 17. P.142-170, 2013.

JEUDY, Henri-Pierre.  Espelhos da Cidade . Rio de Janeiro, 2005.

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