É comum lermos e escutarmos que “futebol não tem lógica”. O dito se baseia na quantidade de resultados inesperados que verificamos em partidas realizadas pelos campeonatos deste esporte aqui no Brasil e mundo afora. De fato, se o futebol fosse um esporte de resultado lógico, os mais “entendidos” seriam frequentemente os vencedores da loteria esportiva, que teve seu momento áureo na década de 1970.
No entanto, em um raciocínio de longo prazo, observamos certa lógica neste esporte. Tomemos, por exemplo, o Campeonato Brasileiro. Um olhar atento ao que vem ocorrendo nos últimos 10 anos, ou seja, desde 2005, nos mostra certo predomínio de alguns clubes entre os quatro primeiros colocados, o tal do G4, o grupo que se classifica para a Copa Libertadores da América.
A partir desta observação, poderíamos levantar a hipótese de que em um campeonato de pontos corridos (desde 2003 o campeonato é disputado desta forma) o planejamento se torna ainda mais necessário para formar equipes vencedoras. E, neste sentido, a lógica do futebol começaria a mostrar a sua cara. Um planejamento bem feito com investimentos estratégicos em uma equipe podem não garantir o êxito em uma ou outra partida isolada, mas produziria alguns resultados positivos quando passamos a utilizar uma perspectiva mais panorâmica, de longo prazo, ainda mais com a atual forma de disputa do Brasileirão.

E por falar em campeonato de pontos corridos, estamos na reta final do Campeonato Brasileiro e, mais uma vez, se tem discutido a respeito dessa fórmula. Lembro que a realização de um campeonato com pontos corridos era uma demanda antiga de parte da imprensa à época dos confrontos mata-mata entre os oito primeiros colocados na fase final do campeonato. A reivindicação se apoiava no argumento de justiça, já que muitas vezes o time de melhor campanha se via eliminado tão logo se iniciava o mata-mata, ainda que estivesse com 15 ou mais pontos à frente de seu oponente. Atendida a reivindicação, o campeonato Brasileiro passou a ser disputado no sistema de pontos corridos até o final. Só que de uns tempos para cá, a discussão sobre a melhor forma de disputa voltou à tona por conta do raciocínio de que os atletas jogariam “desmotivados” uma partida em que o resultado pudesse favorecer o rival local, bem como pela perda da “emoção” quando uma equipe não pode ser mais alcançada em sua posição de primeiro colocado, faltando ainda duas ou três rodadas para o término da competição.

Afinal, pontos corridos ou mata-mata? Qual das duas seria mais justa no Brasileirão? Reproduzo aqui, com ligeiras modificações, o que escrevi com Lovisolo em artigo publicado em “O Globo”, impresso no dia 1 de dezembro de 2010.
Os defensores dos pontos corridos apontam que a justiça está nessa fórmula, pois o futebol pode apresentar resultados injustos sob o ponto de vista do desempenho dos times em apenas duas partidas. Um mata-mata ao final da competição igualaria o que, por méritos dos competidores, não deveria ser igualado. Ou seja, o de pior campanha pode ganhar e se sagrar campeão. Assim, o campeonato de pontos corridos promoveria a oportunidade de justiça. Os defensores do mata-mata, por sua vez, têm apontado que a fórmula atual tem promovido o ato antiético, porque, por vezes e, principalmente, do ponto de vista do torcedor, seria bom perder para não favorecer o adversário tradicional. O mais grave é quando atletas tendem a compartilhar essa opinião de torcedores. O mata-mata, então, impediria este comportamento antiético. Joga-se para ganhar ou se cai fora. Além do elemento “emoção’, que tende a estar presente nesta disputa.
Aparentemente, os dois valores são importantes e possuem valor moral considerável. Ocorre que não são conciliáveis: não temos como aumentar a justiça e ao mesmo tempo reduzir as condutas antiéticas. Se admitirmos a não conciliação e o valor de ambas as promoções, o que faremos?
A fórmula de pontos corridos parece ser a mais justa – ou menos injusta -, mas não impede comportamentos que ferem o espírito esportivo. Então, o problema não estaria na fórmula, e sim na conduta de alguns de seus participantes. A solução seria encontrarmos caminhos para coibir o ato antiético. Afinal, jogar sem pretender ganhar é abandonar o espírito esportivo. Mas como fazer isso? E como impedir que um clube seja o vencedor antes da última rodada? Em um campeonato “emocionante”, só conhecemos o campeão na última rodada.
São questões de difícil solução. Talvez, continuar discutindo o problema seja um caminho razoável para o entendimento e o consenso da melhor forma de disputa.