Neymar sempre permeou os estudos de nosso laboratório. Vários integrantes já publicaram artigos sobre sua trajetória e analisaram as possibilidades iminentes de se tornar um grande ídolo nacional[1]. Como nosso foco é se aprofundar nas relações entre mídia e esporte, abordávamos mais os efeitos simbólicos de Neymar fora de campo do que seu desempenho dentro das quatro linhas. Este texto estava pronto. Sua intenção era abordar como às vésperas de uma competição importante sediada no Brasil, Neymar não havia alcançado o posto de “maior ídolo”, posição que tanto instigou reflexões de alguns colegas deste grupo, inclusive eu. Aproveitaria suas recentes ações para retomar a argumentação que levantei na época de sua ida para o PSG: deve ser muito ruim ter apenas dinheiro. O foco seria sua reação ao tomar uma “caneta” do jogador do sub-20 Weverton em um treino da seleção[2]. Gastaria algum tempo fazendo uma analogia ao contexto nacional, abordando a seguinte questão: mais importante do que qual caneta você usa, é a sua reação após os atos de usar uma caneta. Se é bic, ou foi dada por um jovem, depois dela o seu comportamento mostra os rumos de sua índole. Neymar, o que sempre se queixou de ser agredido por usar sua habilidade, não gostou de levar o drible (fato normal para um atacante), derrubou o garoto e saiu sem levantá-lo. Seu pai, o Neymar primeiro que deu início a dinastia e, por conta disso, o filho usa o Jr., chegou a declarar que estava “cansado do sistema socialista no futebol”. Para Neymar I neste sistema todos deveriam ser iguais e o talento não seria permitido[3]. Após acompanharmos seu encontro com o atual governo para falar sobre uma renegociação da dívida do filho na Receita Federal[4], entende-se que seu pensamento é bem aliado ao conceito de socialismo deste mesmo governo. Infelizmente, a história da caneta termina aqui, pois precisamos dar espaço a outro tema. Mais uma vez, não vamos falar do jogador Neymar e sim da celebridade Neymar. O “menino e seu staff” se esforçam para o segundo vencer o “duelo” contra o primeiro. Duelo que um outro camisa dez do Santos, separou entre “o Edson” e “o Pelé”.

O que falta para Neymar ser o jogador que todos esperávamos? O futuro ainda lhe reserva ser o melhor do mundo? O que aconteceu com o caminho que, após a primeira temporada no Barcelona, parecia ser cristalino e inevitável? Sua trajetória e desempenho conseguia reunir os atributos sempre tão rememorados e reforçados na imprensa nacional, conhecidos como o “futebol-arte”. Uma habilidade monstruosa, ofensividade, talento na hora de balançar as redes e o drible como marca registrada. Na esteira de Leônidas, Garrincha, Pelé, Zico, Romário e Ronaldos, Neymar seguraria este estandarte tão presente no imaginário mundial e acionado como referência imediata ao falarmos de futebol brasileiro.
Entretanto, a redenção ao dinheiro e ter um clube para chamar de seu causaram efeitos mais maléficos em sua carreira do que os otimistas previam. É notório que esportivamente ele “andou para trás”. Uma narrativa à parte, consequentemente criou um mundo à parte, descolado de alguns aspectos da realidade que barraram toda e qualquer possibilidade de Neymar compreender que a caminhada rumo ao posto de grande ídolo não é automática, por mais que suas campanhas publicitárias milionárias sugerissem. Não só as campanhas, mas o aparato da seleção brasileira, incluindo Tite, passou a integrar esta bolha. Na Copa de 2018, o choque entre realidade e o mundo à parte de Neymar foram implacáveis. Entrou como condutor da redenção após o 7 a 1 e candidato a herói e saiu como piada mundial. Análise das ações? Nunca. É difícil ser Neymar. Tão difícil que dar um soco em um torcedor rival após perder um título na França é considerada uma reação “natural” para o “menino” de 27 anos.
Em meio a uma desconfiança se tudo o que Neymar ainda não demonstrou pode seria visto na Copa América, mais um caso de quem ainda não aprendeu fatos básicos, tipo: NÃO É NÃO. Mas esta frase soa como uma afronta para quem é mais mimado do que deveria. O caso está se desenrolando a cada dia, indicando erros de Neymar na condução do acontecimento desde o seu início. Defesas do jogador escancaram, na maioria dos casos, uma visão machista que hoje ocupa o planalto. O menino, que carregava o estandarte do futebol nacional com a camisa dez amarelinha (que hoje não se limita apenas a seleção e, infelizmente, engloba também uma manifestação política), parece clamar pelo apito final do jogo para poder “superar” os problemas e entrar em campo. No campo de futebol tentará melhorar sua imagem tão supostamente elaborada, ajustada e pensada fora dele. É o cenário salvador para o momento, onde ele aposta suas fichas. Será que consegue? Entre escolhas erradas e caminhos obscuros na vida pessoal, só resta aos amantes de seu talento parafrasear suas mensagens divulgadas para a internet toda ler e…“sentir saudades do jogador que ele ainda não foi”.
[1] Link da aba artigos do blog
[2] https://www.youtube.com/watch?v=gcjcxDXQ93k
[3] https://odia.ig.com.br/esporte/2019/01/5615162-pai-de-neymar-desabafa-e-fala-em–sistema-socialista-de-futebol—-nao-pode-ter-talento.html
[4] https://esportes.estadao.com.br/noticias/futebol,pai-de-neymar-e-recebido-por-bolsonaro-e-guedes-para-tratar-de-cobrancas-da-receita-ao-jogador,70002795516
*Texto escrito na segunda-feira, dia 03/06.