Um grande evento de Boxe amador na Cidade Partida

No último dia 11 de março foi realizado no emblemático e luxuoso Hotel Sheraton na Avenida Niemeyer mais um evento de boxe amador realizado pela ABP (Associação Brasileira de Pugilismo), que contou com a presença de atletas de diferentes Academias da cidade do Rio de Janeiro em um ambiente amistoso e familiar, entretanto, extremamente competitivo e cativante.

O boxe, apesar de ser um dos esportes modernos mais tradicionais e antigos da História, não se tornou ao longo do século XX em uma modalidade extremamente popular no Brasil, como alguns esportes coletivos: futebol, voleibol, basquetebol, etc. Além disso, não possui a mesma visibilidade, investimento público ou privado, espaço midiático que possui em outros países do continente americano como Estados Unidos, México, Cuba, Argentina, Colômbia, etc.

Meu interesse pessoal na modalidade foi retomado a partir da participação em um evento acadêmico sobre o esporte na cidade colombiana de Cartagena, em 2014. Na ocasião, fui convidado pelo companheiro colombiano David Quitían, que foi orientado pela saudosa Simone Guedes, a dar uma palestra intitulada “El boxeo en el país del fútbol. Quando eu era jovem,  adorava acompanhar as lutas de grandes lendas como Mike Tyson, Julio César Chavez, George Foreman, Evander Holyfield e aqui no Brasil acompanhava no Show do Esporte, da rede Bandeirante, as lutas do polêmico e, talvez injustiçado, Adílson Rodrigues “Maguila”.

Por um longo tempo, por diversas questões, acabei deixando de acompanhar o nobre esporte. O retorno de um interesse antigo e a necessidade de praticar uma nova atividade física além da natação, e de sociabilidade, me levaram, a partir de 2017, justamente à tradicional  Academia Radar onde se localizava a Federação Carioca de Boxe, que deu origem à ABP, e onde encontrei um ótimo ambiente para uma prática esportiva e de lazer mesmo já estando com mais de quarenta anos.

O presidente da ABP Alessandro Leite foi boxeador amador, é professor de boxe na rede estadual Faetec e, além de instrutor e técnico, procura promover eventos em diferentes espaços públicos e privados da cidade do Rio de janeiro como já ocorreu, por exemplo, na praia de Copacabana três vezes, em outros hotéis luxuosos e recentemente no Hotel Sheraton em São Conrado, além de tradicionais Academias na cidade. Atualmente outros eventos estão acontecendo a nível nacional em função de parcerias estabelecidas pela ABP com outras associações ou academias, sendo atualmente 32 vinculadas.

Alessandro Leite – Presidente da ABP (Associação Brasileira de Pugilismo).
Fonte: Fotógrafa Marina Torres. 

A promoção de eventos de boxe amador pela ABP ajuda a popularizar um esporte que vem crescendo no país nos últimos anos, tanto no número de medalhistas olímpicos, quanto nos atletas brasileiros que se profissionalizaram, adotando, entretanto, um caráter social de inserção e de oportunidades para muitos jovens em uma atividade esportiva clássica.

Foram dez lutas envolvendo a esperança de uma carreira esportiva para 20 atletas que disputaram a Copa Eduardo Cardoso, ex-boxeador. Importante destacar que todos os eventos organizados pela ABP são batizados homenageando ex-atletas que tiveram destaque sobretudo no boxe amador.

A maior parte das lutas foram emocionantes e equilibradas, mas podemos destacar diversos momentos como o incrível combate entre Mauro Marques (Chocolate Team) x Pedro Nobre (Spartan), que terminou empatado em pontos e teve que ser decidido extraordinariamente pelos juízes levantando as mãos individualmente, luta que foi unanimemente considerada a melhor da noite, além de  um incrível nocaute do atleta Samuel Cavalcante (Spartan) em Alfredo Alves (No Fake Boxe), na penúltima luta entre pesos pesados.

Entretanto, o momento mais marcante para mim foi a vitória do meu ex-aluno do município Lucas Diniz, da Academia Nova União, na categoria até 75 kg contra Ramyro Rodrigues (GB Team).

Carlos Balduíno (Árbitro e Ex-boxeador), competidores: Lucas Diniz, Mauro Marques e Pedro Nobre com sua simpática filha recebendo o prêmio de melhor luta. Fonte: Fotógrafa Marina Torres. 

Lucas tinha sido meu aluno no ensino fundamental na Escola Roma, em Copacabana, antes da Pandemia. Recordo que era um garoto bem bagunceiro, extremamente indisciplinado, desinteressado com os estudos, mas, pelo menos comigo, era pacífico e sabia ouvir. Estava começando a praticar boxe e eu estava em uma fase bem assíduo e empolgado com os treinos na Associação, então passamos a ter um elemento de identificação que possibilitou que ele, metaforicamente, abrisse a guarda e melhorasse seu comportamento na minha aula.

Quando o encontrei no salão de eventos do Sheraton e ele me disse que ia lutar, seria seu sexto combate, que o boxe tinha ajudado ele a se disciplinar e ter mais foco na vida, que tinha completado o ensino médio e pretendia fazer faculdade de Educação Física, e que se desculpava pelo comportamento na escola. Além disso tudo me falou com orgulho que atualmente sobrevive do esporte inclusive dando aulas para um projeto comunitário da Favela dos Tabajaras, fato que me deixou extremamente feliz com mais uma lição de vida dada pelo esporte.

Lucas venceu a sua luta, permanece sonhando com uma carreira profissional, mas com o pé nos chãos da difícil batalha de sobreviver. Teve a sorte do seu tio, o ex-lutador Giovanni Diniz, e sua família terem lhe apoiado, e a humildade e competência de lutar pelos seus objetivos.

 E nessa noite que ainda foi sorteado com uma estada em uma Pousada em Cabo Frio, saiu com o mesmo sorriso inocente de uma criança que recebeu um presente inesperado, assim como eu que me emocionei com sua vitória por pontos sobre o adversário, e sua conquista maior que foi proporcionada pelo esporte, um caminho a seguir.

Assim sendo a importância daqueles que organizam e estimulam o desenvolvimento e eventos dos esportes amadores como a ABP, lutando por patrocínios, premiações, locais de visibilidade para a modalidade, contra o preconceito que muitas vezes existe com esse tradicional esporte, é grandiosa e merece ser exaltada para que diversas histórias, como a de Lucas e todos os competidores envolvidos se repita diversas vezes.

Cerca de cem pessoas: familiares, praticantes, amigos e, inclusive hóspedes do hotel, como um senhor inglês que acompanhou todas as lutas com quem eu conversei rapidamente, presenciaram uma incrível noite de boxe amador defronte às famosas praias cariocas, aos pés dos Dois irmãos e do Morro do Vidigal, celebrando em um espaço restrito a raros privilegiados um evento extremamente excitante, tanto pelos combates, quanto pelas histórias de vida desse universo particular do boxe amador carioca.  

Espectadores de todas as idades no saguão da piscina do Sheraton acompanhando o evento. Fonte: Fotógrafa Marina Torres. 

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