A última rodada do Campeonato Brasileiro de 2017 demonstrou como é o drama vinculado à paixão clubística o que mais atrai e fascina os torcedores de times de futebol. Não se falou em futebol-arte, como não se falou nisso durante todo o campeonato. Não se falou em belas jogadas ou em gols espetaculares, ainda que eles tenham acontecido. O que ficou mesmo marcado na memória e nas narrativas da imprensa foi a dramatização dos gols ocorridos ao final de várias partidas.
O professor de Stanford, Hans Ulrich Gumbrecht, em um belo e importante livro, Elogio da Beleza Atlética, presume que o fascínio dos esportes estaria na beleza dos corpos em movimentos. Gumbrecht e eu já conversamos sobre o tema e eu ponderei sobre a dramatização do futebol e nos fortes vínculos dos torcedores com seus clubes. A partir daí, o cientista social disse que iria se debruçar sobre o drama no estádio, que hoje, em tempos de estádios mais elitistas e com capacidade de público reduzida, se estende para os bares e lares das cidades.
Poderíamos falar do drama do goleiro do Flamengo, alcunhado como “Muralha”. A solidão proporcionada pela posição do goleiro ficou estampada em sua face. Mas foi sua solidão e seu drama particular que fizeram do jovem César um herói improvável nas duas partidas que disputou até agora neste fim de ano. O torcedor, com sua paixão muitas vezes indômita pelos seus clubes, é volúvel e dramático. O herói de hoje já foi o “frangueiro” de anos atrás. Os atletas profissionais vão escrevendo suas histórias a partir de suas atuações. E essa “escrita” é frequentemente permeada de dramatizações.

Nos minutos finais deste campeonato, o Vasco estava se classificando direto para a fase de grupo da Libertadores, Flamengo e Botafogo estavam na pré-Libertadores, e Chapecoense e Atlético Mineiro lutavam desesperadamente para conseguir uma destas vagas. Do outro lado da tabela, Coritiba, que jogava contra a Chapecoense, e Vitória, que enfrentava o Flamengo, lutavam para se manter na primeira divisão.
Um pênalti a favor do Flamengo no último minuto da partida gerou uma tensão em vários torcedores, não somente os que estavam nos estádios. A conversão do pênalti em gol resultou em uma entusiástica comemoração dos torcedores do Flamengo, a qual não tinha nada a ver com a beleza da cobrança. Era a passagem direta para a fase de grupos da Libertadores que se festejava naquele momento. A forma como se daria esse gol era o que menos importava nos instantes finais. Os torcedores do Vasco, que já se consideravam donos desta vaga, se entristeceram e os do Vitória foram da extrema tristeza, por terem acreditado que, com este gol, seu time estava rebaixado, a uma tremenda euforia com o anúncio do gol da Chapecoense contra o Coritiba, rebaixando este último e mantendo o Vitória na primeira divisão. Agora a Chapecoense estava na pré-Libertadores, vaga muito comemorada. Tristeza para os torcedores do Coritiba. E o gol do Atlético Mineiro contra o Grêmio no fim da partida tirou do Botafogo qualquer chance de ir para a competição internacional em 2018. Ao Atlético resta a esperança de, com um possível título do Flamengo na Sul-americana, se abra mais uma vaga para a Libertadores.

Em um esporte em que as paixões estão vinculadas aos clubes, a beleza dos corpos em movimentos, dos gols e das jogadas são secundarizadas diante da dramatização do resultado. No futebol, o fascínio está no drama. Sem ele, o torcedor se afastaria e teria um interesse muito menor.